quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O velho e o mar


É um velho de pé na ré de um barco. Aperta nos braços uma mala leve e um recém-nascido, ainda mais leve do que a mala. O velho chama-se Senhor Linh. É o único a saber que se chama assim pois todos os que o sabiam morreram à sua volta.De pé na popa do barco, vê afastar-se o seu país, o dos seus antepassados e dos seus mortos, enquanto a criança dorme nos seus braços. O país afasta-se, torna-se infinitamente pequeno, e o Senhor Linh vê-o desaparecer no horizonte, durante horas a fio, apesar do vento que sopra e o sacode como uma marioneta.A viagem prolonga-se por muito tempo. Dias e dias. E o velho passa todo este tempo na popa do barco, de olhos postos na esteira branca que acaba por se unir ao céu, a perscrutar o horizonte para continuar a distinguir a costa esvanecida. Quando o conduzem ao camarote, deixa-se guiar sem dizer nada, mas encontram-no um pouco mais tarde, na ponte da popa, uma mão agarrada à amurada, a outra estreitando a criança, a pequena mala de couro fervido pousada aos pés. A mala está atada por uma correia para não poder abrir-se, como se guardasse bens preciosos. Na verdade, contém roupa co­çada, uma fotografia que a luz do sol apagou quase totalmente, e um saco de lona no qual o velho conserva um punhado de terra. Foi tudo o que o homem pôde levar consigo. E a criança, obvia­mente.

Phillipe Claudel ,1ªpágina de A Neta do Senhor Linh

Também lido no Ao longe os barcos de flores da Amélia Pais

14 comentários:

  1. mmmh é lindo esse livro sim.
    Se já o leu sabe... senão leia e vai ver...
    um abraço e se não for muito invasivo da minha parte diga-nos algo do seu pai

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  2. já li, C.
    Ainda lá está embora estabilizado...
    obg pelo cuidado...

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  3. Muita coragem...
    Estamos tod@s consigo

    Obrigada pelas notícias.

    Um abraço
    C.

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  4. Sabe o que é fantástico?

    É que ofereci esse livro à amiga que me fez conhecer este blog...

    Para quem é tão céptica como eu, há de facto coincidências incríveis.
    C.

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  5. P . Estamos a falar do clássico de Hemingway?

    A história tocante do velho pescador que faz uma viagem extrema pelo mar?
    Se for esse ... o mais belo do livro é o que se lê entre as linhas.

    Beijinhos até amanhã!

    Tenho nome de Flor

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  6. Não. Estamos a falar de um livro que se chama " A neta do Senhor Linh" de Philippe Claudel. Comprei-o por acaso na Feira do Livro deste ano porque me chamou a atenção a imagem da capa e as "letras" da contracapa. Li-o há muito pouco tempo. Adorei. Quis comprar mais para oferecer. Está esgotado. Mas se encontrar vale a pena comprar. É muito muito bonito.

    Abraço
    Carmo

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  7. Carmo

    Eu sei de que livro se fala .
    Brinquei com o P. , agarrei o titulo do post e fui buscar um clássico de Hemingway!

    Mas tem toda a razão o livro que pelos vistos todos lemos é fantástico.

    Bem-Haja

    Tenho nome de Flor

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  8. ok. A gozar comigo e eu a ver...

    É bom também sabermos rir de nós próprios... eh eh
    Agora deixou-me com um sorriso...
    um abraço e boas leituras. Vamos partilhando.
    Carmo

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  9. Carmo.

    Pode tratar-me por Flor como todos aqui me tratam.

    "Gozar " nunca poderia ser a minha intenção!!!
    Aqui, brincamos, partilhamos, lamentamos, bebemos informação e usufruímos de momentos belos e únicos de leitura e escrita!
    Sempre com muito respeito.
    Estava a brincar com o P. nesta nossa cumplicidade convindo.

    Beijinhos fique sempre

    tenho nome de Flor

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  10. Flor
    Não se preocupe, a palavra "gozar" não foi pensando que teve qualquer intenção maldosa...
    É bom conseguirmos brincar no meio de uma vida às vezes tão séria e em que nos levamos tão a sério em coisas que não deviam ter importância. Importante é esta partilha, é existirem espaços como este...
    O livro que leio agora e não conhecia é "As velas ardem até ao fim" de Sandor Marai (falta algures um acento) e que teimo em não terminar por estar a gostar tanto que tenho que o saborear aos poucos.
    Se não leu aconselho vivamente
    Um abraço e muita "brincadeira"
    Carmo

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  11. Carmo.
    Eu estou a ler" a História de Edgar Sawtelle".
    tem profundidade psicológica e mestria poética.

    Ainda não li aquele que me recomenda mas prometo que vou tentar .

    Carmo mais uma vez lhe afirmo que aqui na Magnólia do Paulo, do Gui e da Passiflora, e, que nós tomamos de assalto para enriquecermos a alma e o coração existe a mais profunda amizade, cumplicidade e respeito.

    beijinhos com brincadeira associada .

    Tenho nome de Flor

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  12. Aquela que me pareceu a mais bela página do livro " As velas ardem até ao fim" está reproduzida neste blog com o Título o Lusco-fusco da madrugada

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  13. Passi .
    Foi publicado por si em 11 de Agosto de 2008 às 18.07
    Ainda não andava por aqui! já fui ver belo post como sempre.

    "Era o momento em que a noite se separa do dia, o mundo de baixo do mundo de cima..."

    Prometi à Carmo que vou ler.

    Beijinhos Passi. :)
    Fico aqui sempre à espera de algo vindo de si!!!!!

    Tenho nome de Flor

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