quarta-feira, 2 de abril de 2008

Hotel de ambos os Mundos


Tivera êxito quase a todos os respeitos excepto na sua vida de casado, embora, na realidade o êxito nunca o houvesse preocupado muito.
O que lhe interessava era a pintura e os filhos, e continuava apaixonado pela primeira mulher que despertara o seu amor.
Amara muitas mulheres desde então e, por vezes, lá vinha uma ou outra ficar na ilha. Precisava de ver mulheres ao pé de si e acolhia-as bem durante algum tempo. Gostava de as ler ali, às vezes durante longo período.
Mas, no final, ficava sempre satisfeito quando se iam embora, mesmo se gostava delas a valer, Disciplinara-se de forma a deixar-se de discussões com mulheres, e aprendera a arte de não se casar. Estas duas coisas haviam sido quase de tão difícil aprendizagem como instalar-se e pintar a um ritmo regular e bem ordenado.
Mas aprendera a fazê-las, e a sua esperança era que essa aprendizagem tivesse sido permanente. Havia muito que sabia pintar, e estava convencido de que ia aprendendo sempre mais a cada ano que passava. Mas fora difícil aprender a assentar e a pintar disciplinadamente porque tinha havido na sua vida uma fase em que ele próprio não fora disciplinado.
Nunca tinha sido verdadeiramente irresponsável, mas indisciplinado, egoísta e desapiedado, isso sim. Sabia-o agora, não por muitas mulheres lho terem dito, mas por o haver descoberto finalmente à sua custa. Resolvera então só ser egoísta na sua actividade de pintor, só ser desapiedado no seu trabalho, e disciplinar-se e aceitar a disciplina.
(…)
Ernest Hemingway, Ilhas na corrente (trad. Jorge Rosa, Livros do Brasil)
(Da C.)

1 comentário:

Guilherme Salem disse...

AH! Emingway (ou Hemingway ?)..desde os sinos que dobram, ao sangue na arena...tanta humanidade e crueza a escorrer daquelas palavras.