domingo, 20 de abril de 2008

Jogo a dois (moderato cantabile)


Eu, sabendo que te amo,
E como as coisas do amor são difíceis,
Preparo em silêncio a mesa
do jogo, estendo as peças
sobre o tabuleiro, disponho os lugares
necessários para que tudo
comece: as cadeiras
uma em frente da outra, embora saiba
que as mãos não se podem tocar,
e que para além das dificuldades,
hesitações, recuos
ou avanços possíveis, só os olhos
transportam, talvez uma hipótese
de entendimento.É então que chegas,
e como se um vento do norte
entrasse por uma janela aberta,
o jogo inteiro voa pelos ares,
o frio enche-te os olhos de lágrimas,
e empurras-me para dentro, onde
o fogo consome o que resta
do nosso quebra-cabeças.

(Nuno Júdice)
Post Scriptum:
“Uma pessoa é um mistério, duas, com um abismo pelo meio, uma prodigiosa contradição.(…) Afinal, não sabemos como procurar, nem onde encontrar, nem, afinal, sabemos o que procurar. Somos assim, tão perdidos, que nos agarramos sem sequer poder tocar.(…)”
(Pedro Paixão)

3 comentários:

Passiflora Maré disse...

É verdade, César Paulo com nome de praia ou de actriz, a relação, o jogo a dois é a mais difícil de todas as tarefas a que nos entregamos.
Ás vezes parece que vai tudo pela borda fora. Outras vezes, abre-se o céu e recolhe-nos lá dentro, num lugar secreto por mais ninguém partilhado, numa intimidade de corpos e de almas, é o êxtase...

Anónimo disse...

Tem sido um encantamento (re)descobrir estes textos do P.P.- são indelevelmente de uma beleza e musicalidade sublimes.
Bj.
C.(EN)

Anónimo disse...

Com especial encanto vejo a referência ao Pedro Paixão (não é fácil carregar um nome assim, cuido eu...)depois da drástica crítica que no Expresso se lançou sobre o seu (último)romance. Parabéns pela escolha e por tudo o mais do blogue. Porque chovem sapos é que me atormenta, ainda...