«A encosta é enorme, mas eu vou devagar com os pés bem firmes nos travões. Lá em baixo, a nossa casa é apenas um pontinho vermelho. Sei que o meu pai está à minha espera no fundo da rampa, escarrapachado na bicicleta. Sei que está a sorrir.
Assim que ganho velocidade, agarro-me com força ao volante e endireito-me como o meu pai me tinha ensinado. Gradual e calmamente, começo a soltar as mãos. Rapidamente estou a descer a encosta com os braços levantados para o céu e as mãos do vento a segurarem-me.
- Olha, Papá, olha!
Eu e a minha linda bicicleta somos uma só. Tenho oito anos. Sou a rainha do vento, montadas nas costas de uma pantera, rodas a chiar, pedras pelo ar, engolindo a estrada de seda preta.
Mas agora vou tão depressa que os meus pés não conseguem encontrar os travões. Agarro o volante, mas a pantera salta debaixo de mim, rugindo nos meus ouvidos. A roda vai para aqui, a roda vai para ali e estou a ir directamente contra o meu pai.
Os braços do papá abrem-se como asas. Não consigo falar, não consigo gritar, não consigo parar, cada vez mais depressa, cada vez mais perto. É então que voo pelo espaço, por cima do volante. Vou morrer. A minha cabeça choca com a dele com um estrondo horrível, o meu pé enrolou-se nas mudanças.
- Estás bem? - grita ele. - Estás bem?
Abro os olhos. A nossa casa alta e vermelha está de pernas para o ar por cima de mim. Levanto a cabeça e vejo a cara dele. o sangue cobre-lhe os dentes e corre pelo queixo abaixo. Meu querido e bonito Papá, o que foi que eu fiz?
Estamos todos embrulhados, o meu pai e eu: braços, raios de roda, pernas, correntes. Dói-me o corpo todo. Mas consigo sentir a respiração dele, para dentro e para fora, para dentro e para fora, suave como um murmúrio de uma borboleta. Estamos vivos. E aqui está esta paz, esta felicidade terna enquanto estou tranquila em cima do seu peito, por baixo da roda que continua a girar.»
Prólogo da obra, "A Guerra Secreta Do Meu Pai"
de Lucinda Franks
Assim que ganho velocidade, agarro-me com força ao volante e endireito-me como o meu pai me tinha ensinado. Gradual e calmamente, começo a soltar as mãos. Rapidamente estou a descer a encosta com os braços levantados para o céu e as mãos do vento a segurarem-me.
- Olha, Papá, olha!
Eu e a minha linda bicicleta somos uma só. Tenho oito anos. Sou a rainha do vento, montadas nas costas de uma pantera, rodas a chiar, pedras pelo ar, engolindo a estrada de seda preta.
Mas agora vou tão depressa que os meus pés não conseguem encontrar os travões. Agarro o volante, mas a pantera salta debaixo de mim, rugindo nos meus ouvidos. A roda vai para aqui, a roda vai para ali e estou a ir directamente contra o meu pai.
Os braços do papá abrem-se como asas. Não consigo falar, não consigo gritar, não consigo parar, cada vez mais depressa, cada vez mais perto. É então que voo pelo espaço, por cima do volante. Vou morrer. A minha cabeça choca com a dele com um estrondo horrível, o meu pé enrolou-se nas mudanças.
- Estás bem? - grita ele. - Estás bem?
Abro os olhos. A nossa casa alta e vermelha está de pernas para o ar por cima de mim. Levanto a cabeça e vejo a cara dele. o sangue cobre-lhe os dentes e corre pelo queixo abaixo. Meu querido e bonito Papá, o que foi que eu fiz?
Estamos todos embrulhados, o meu pai e eu: braços, raios de roda, pernas, correntes. Dói-me o corpo todo. Mas consigo sentir a respiração dele, para dentro e para fora, para dentro e para fora, suave como um murmúrio de uma borboleta. Estamos vivos. E aqui está esta paz, esta felicidade terna enquanto estou tranquila em cima do seu peito, por baixo da roda que continua a girar.»
Prólogo da obra, "A Guerra Secreta Do Meu Pai"
de Lucinda Franks
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