terça-feira, 4 de agosto de 2009

H1N1


ANTÓNIO LOBO ANTUNES
(Sátira aos HOMENS quando estão com gripe)

Pachos na testa, terço na mão,
Uma botija, chá de limão,

Zaragatoas, vinho com mel,
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai Lurdes que vou morrer.
Mede-me a febre, olha-me a goela,
Cala os miúdos, fecha a janela,
Não quero canja, nem a salada,
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto,
Já vejo a morte nunca te minto,
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
anjos estranhos, cornos e rabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes fica comigo
Não é o pingo de uma torneira,
Põe-me a Santinha à cabeceira,
Compõe-me a colcha, Fala ao prior,
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o Doutor, passa a chamada,
Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada.
Faz-me tisana e pão de ló,
Não te levantes que fico só,
Aqui sózinho a apodrecer,
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.

2 comentários:

JOCENDIR CAMARGO disse...

Inteligente, agradável e surpreendente... sabes trabalhar até coisas feias como essa tal gripe...

Parabéns por seu espaço...
um beijo com meu carinho...

César Paulo Salema disse...

Grato, J.
Volte sempre.