sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Pandemia poética


Direi como disse um médico famoso: «O ser humano que matava com uma lança os leões treme hoje com a picada duma mosca.»
Isto quer dizer alguma coisa de angustiante, e nós sabemos que a angústia nos mantém em cativeiro. O modo de vida urbano propagou-se à província, o homem levou as suas doenças até ao sertão mais impenetrável, e uma série de maldições pesa sobre a nossa saúde tornada delicada.
O sabor do vinho tornou-se venenoso, o sol já não tem o mesmo efeito abrasador e doce na nossa pele; pomos o pé com precaução no solo, desinfectamo-nos antes de dormir e ao acordar.



agustina bessa-luís
dicionário imperfeito
guimarães editores
2008

1 comentário:

Guilherme Salem disse...

Ainda bem que colocaste aqui este texto da Mestra...
A Senhora está completamente taralhouca hoje em dia (seja senilidade seja o alemão Alzheimer-se é assim que se escreve-), mas continua única. Só não pode é aparecer em público.
Eu propunha-a para ser a segunda mulher a entrar no Panteão Nacional.
Quem nunca a leu, não sabe viver.