quarta-feira, 1 de setembro de 2010

À espera de Setembro


CAFÉ DE SUBÚRBIO (14)

Já não há mármore na mesa,
Onde o poeta ou o pintor
Esboce um verso, um traço de beleza:
Dê um sinal de si, se for.

Lembro os perfis desses clientes,
Debruçados no espelho do tampo claro e liso,
Como se vissem aflorar, em águas doentes,
Ainda impreciso, um rosto de Narciso.

E o lápis vagueava, a imaginar o rumo
Da voz que só em nós se sente e escuta,
A expandir-se da névoa, entre névoas de fumo,
No crispado da escrita, na lânguida voluta.

Eles, rostos de boémia, o chapéu desabado.
Na xícara, o café a arrefecer da espera.
E o mármore feliz de se ver violado!
E um frémito, em redor, da Primavera!

Acabados o café e a inspiração,
Lançavam para ali o cobre da despesa.
Logo vinha o criado (era criado, então!),
Arrecadava o cobre e, sem hesitação,
Limpava todo o oiro do mármore da mesa.

António Manuel Couto Viana
(1923 – 2010)
As escadas não têm degraus, nº4
(Cotovia, 1991)

1 comentário:

Anónimo disse...

Estampa-se o sol em delicados raios sobre o mármore branco e liso...
Tão bela é a vista que o Verão pinta na floreira da minha varanda
Castanho da terra e o verde das plantas unem-se.A água que tenho no copo , fresca, brilha,
E eu aqui sentada , sozinha na varanda da minha vida só penso como em vez do copo de água me apetecia um precioso café mesmo que fosse num café de um qualquer subúrbio ...
Tenho nome de Flor