quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Zé Luís


Amor. Amor. Amor, gostava de dizer esta palavra até gastá-la ainda mais.
Amor, gostava de dizer esta palavra até perder ainda mais o seu sentido.
Amor. Amor. Amor, até ser uma palavra que não significa nem sequer uma ilusão, uma mentira.
Amor, amor, amor, nem sequer uma mentira, nem sequer um sentimento vago e incompreensível.
Amor amor amor, até ser nem sequer uma palavra banal, nem sequer a palavra mais vulgar, nem sequer uma palavra.
Amoramoramor, até ao momento em que alguém diz amor e ninguém vira a cabeça para ouvir, alguém diz amor e ninguém ouve, alguém diz amor e não disse nada. Sozinho, diante da campa. O amor é a solidão.


José Luís Peixoto
in «Uma Casa Na Escuridão»

2 comentários:

Elsa C. disse...

Belíssimo!

Eu disse...

«O amor pede identidade com diferença, o que é impossível já na lógica, quanto mais no mundo. O amor quer possuir, quer tornar seu o que tem de ficar fora para ele saber que se torna seu e não é. Amar é entregar-se. Quanto maior a entrega, maior o amor. Mas a entrega total entrega também a consciência do outro. O amor maior é por isso a morte, ou o esquecimento, ou a renúncia - os amores todos que são os absurdiandos do amor.
(...) O amor quer a posse, mas não sabe o que é a posse. Se eu não sou meu, como serei teu, ou tu minha? Se não possuo o meu próprio ser, como possuirei um ser alheio? Se sou já diferente daquele de quem sou idêntico, como serei idêntico daquele de quem sou diferente? O amor é um misticismo que quer praticar-se, uma impossibilidade que só é sonhada como devendo ser realizada.»

Fernando Pessoa, in 'O Rio da Posse'

Eu