terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Sabiá com trevas



(IX)
O poema é antes de tudo um inutensílio.
Hora de iniciar algum
convém se vestir roupa de trapo.
Há quem se jogue debaixo de carro
nos primeiros instantes.
Faz bem uma janela aberta
uma veia aberta.
Pra mim é uma coisa que serve de nada o poema
enquanto vida houver.
Ninguém é pai de um poema sem morrer.

Manoel de Barros

3 comentários:

AugustoMaio disse...

O martírio do (no) poema é, pelo menos, a fuga necessária ao vulgar, enquanto fuga ao tudo que teima arrogantemente conseguir ser nada.
E faz bem, é claro, "uma janela aberta, uma veia aberta".

Anónimo disse...

Muito bonito - acho que o poeta quis dizer que os maiores Poetas são os que vivem, simplesmente e intensamente.È esse o desafio.

Bj.
C(EN)

Passiflora Maré disse...

Compreendo-o Augusto, a vulgaridade... a vulgarização/banalização ... o abuso...
Em criança quando queria testar a consistência de um nome ou de uma palavra dizia-os muitas vezes até ficarem "enrodilhados" o princípio e o fim do nome ou palavra,
e feito isto o nome perdia a ligação à pessoa e a palavra a ligação à coisa, é isto a banalização. Da banalização à vulgaridade vai um passo.
E, nem todos sabemos viver com a vulgaridade.
Admiro Cris que ainda tenhas "tanto sangue na guelra".