segunda-feira, 4 de abril de 2011

Mudança



Não me sinto mudar. Ontem eu era o mesmo.
O tempo passa lento sobre os meus entusiasmos
cada dia mais raros são os meus cepticismos,
nunca fui vítima sequer de um pequeno orgasmo

mental que derrubasse a canção dos meus dias
que rompesse as minhas dúvidas que apagasse o meu nome.
Não mudei. É um pouco mais de melancolia,
um pouco de tédio que me deram os homens.

Não mudei. Não mudo. O meu pai está muito velho.

As roseiras florescem, as mulheres partem
cada dia há mais meninas para cada conselho
para cada cansaço para cada bondade.

Por isso continuo o mesmo. Nas sepulturas antigas
os vermes raivosos desfazem a dor,
todos os homens pedem de mais para amanhã
eu não peço nada nem um pouco de mundo.

Mas num dia amargo, num dia distante
sentirei a raiva de não estender as mãos
de não erguer as asas da renovação.

Será talvez um pouco mais de melancolia
mas na certeza da crise tardia
farei uma primavera para o meu coração.

Pablo Neruda, in 'Cadernos de Temuco'
Tradução de Albano Martins

4 comentários:

R. disse...

Estamos em sintonia poética, P.! Hoje, nas pausas do direito, voltei aos poemas de Neruda :)
Um beijinho, meu amigo!
Gosto de ti :)

Margot Félix disse...

Que belíssimo blog. Identifico-me pelo conteúdo e pelo título que é o nome da minha irmã - Magnólia. =)

Saudações

Margot Félix

César Paulo Salema disse...

Obrigado Margot. Ela também é seu... Bj

Anónimo disse...

Lindo P.

" A poesia tem comunicação secreta com o sofrimento do homem"

Pablo Neruda

Tenho nome de Flor