segunda-feira, 27 de maio de 2013
quarta-feira, 22 de maio de 2013
tempos
O tempo presente e o tempo passado
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro,
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo o tempo é eternamente presente
Todo o tempo é irredimível.
T. S. ELLIOT
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro,
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo o tempo é eternamente presente
Todo o tempo é irredimível.
T. S. ELLIOT
sexta-feira, 17 de maio de 2013
terça-feira, 30 de abril de 2013
domingo, 28 de abril de 2013
fogo aberto
Pedra a pedra a estrada antiga
sobe a colina, passa diante
de musgosos muros e desce
para nenhum sopé;
encurva, na abstracta encruzilhada;
apaga-se, na realidade. Morre
como o rastilho do fogo,
que de campo em campo aberto
seguia, e ao bater na mágica cancela
dobrava a chama, para uma respiração,
e deixava o caminho do portal
incólume e iniciado.
Fiama Hasse Pais Brandão, in "Três Rostos - Ecos"
sobe a colina, passa diante
de musgosos muros e desce
para nenhum sopé;
encurva, na abstracta encruzilhada;
apaga-se, na realidade. Morre
como o rastilho do fogo,
que de campo em campo aberto
seguia, e ao bater na mágica cancela
dobrava a chama, para uma respiração,
e deixava o caminho do portal
incólume e iniciado.
Fiama Hasse Pais Brandão, in "Três Rostos - Ecos"
terça-feira, 23 de abril de 2013
som ou silêncio?
Música Calada
Dizias que nos sobram as palavras:
e era o lugar perfeito para as coisas
esse escuro vazio no teu olhar.
E demorava a dura paciência,
fruto do frio nas nossas mãos vazias
que mais coisas não tinham para dar.
Dizia então a dor o nosso gesto
e durava nas coisas mais antigas
a solidão sem rasto que há no mar.
Luís Filipe Castro Mendes
quinta-feira, 18 de abril de 2013
quarta-feira, 17 de abril de 2013
ao sul
Acercam-se as sombras,
tão longe despenha-se o sol, algures no mar.
As casas são baixas, alinhadas em declive,
os telhados oblíquos,
os pátios circulares, em repouso a esta hora.
Vastas são as vinhas e os terraços,
vastas as vagas de um mar próximo, as pegadas
na praia agora deserta,
recolhidos os remos e as redes,
recolhida a minha vida.
Nada espero senão esta hora já lenta,
uma lua cheia de cio e aflições,
o regresso dos homens e dos cães, a treva.
Que cheguem.
sexta-feira, 12 de abril de 2013
nó
Amigo,
tu que choras uma angústia qualquer
e falas de coisas mansas como o luar
e paradas
como as águas de um lago adormecido,
acorda!
Deixa de vez
as margens do regato solitário
onde te miras
como se fosses a tua namorada.
Abandona o jardim sem flores
desse país inventado
onde tu és o único habitante.
Deixa os desejos sem rumo
de barco ao deus-dará
e esse ar de renúncia
às coisas do mundo.
Acorda, amigo,
liberta-te dessa paz podre de milagre
que existe
apenas na tua imaginação.
Abre os olhos e olha,
abre os braços e luta!
Amigo,
antes da morte vir
nasce de vez para a vida.
Manuel da Fonseca in "Poemas Dispersos".
terça-feira, 9 de abril de 2013
Terreno
Esta terra é nossa - dizem.
Esta terra lembra o desalento do nada
a saudade do verde que se teima em querer durar na nossa vida
Falam de feridas abertas
onde a dor se acende e o vento morno nos embala
A irmã lua ainda dança
para a gente cantar
A mãe lua ainda chama
para a gente dançar...
E se quisermos dobrar a alma
e tecer a tristeza em toques de veludo e de urze despida,
estamos à vontade e à frente do tempo e dos tempos
Vale o cântico desta terra
a fonte que não seca
o xisto que constrói pontes dentro de nós
Onde quer que eu vá
em toda a parte
onde quer que o sonho e a fadiga telúrica me leve,
hei-de lembrar-me de ti.
Terra minha. Terra nossa.
sábado, 6 de abril de 2013
quinta-feira, 4 de abril de 2013
caixa de palavras
Guardarás numa caixinha
o que não fiz por ti,
a mão que não chegou à sobrancelha
que nem aflorou,
o beijo repetido nas palavras
sem que o tacto
o multiplicasse qual se desejava.
Nessa caixa de nada não tardará depois
a não estares só tu,
a não estar só eu,
a estarmos só os dois.
PEDRO TAMEN
o que não fiz por ti,
a mão que não chegou à sobrancelha
que nem aflorou,
o beijo repetido nas palavras
sem que o tacto
o multiplicasse qual se desejava.
Nessa caixa de nada não tardará depois
a não estares só tu,
a não estar só eu,
a estarmos só os dois.
PEDRO TAMEN
segunda-feira, 1 de abril de 2013
Ilha
Houve uma ilha em ti que eu conquistei.
Uma ilha num mar de solidão.
Tinha um nome a ilha onde morei.
Chamava-se essa ilha Coração.
Que saudades do tempo que passei.
Nenhum desses momentos foi em vão.
Do teu corpo, de ti, já nada sei.
Também não sei da ilha, não sei, não.
Só sei de mim, coberto de raízes.
Enterrei os momentos mais felizes.
Vivo agora na sombra a recordar.
A ilha que eu amei já não existe.
Agora amo o céu quando estou triste
por não saber do coração do mar.
Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'
quinta-feira, 21 de março de 2013
poemário
Com uma pêra, dou-lhe um nome de erro
entre mim e tudo, na mão, amadureço
enquanto ela se torna propícia,
amarela ao influxo do vento de estrela para estrela.
O sangue da mão ensombra a fruta na sua volta
de átomos, abala
imagem, arquitectura.
E o espaço que isto cria: a noite
aparece no ar. E dura, leve, tersa, curva,
a linha
do fogo entrecruza
os pontos paralelos: a pêra desde o esplendor,
a mão desde
o equilíbrio, os centros
do sistema geral do corpo, o buraco negro.
Morro?
Escrevo apenas, e o hausto aspira
dedos e pêra, enigma e sentido, ordem, peso, o papel onde assenta
a constelação do mundo com esse buraco
negro e as palavras em torno.
No instante extremo de
desaparecerem.
Se morro, é por exemplo.
Herberto helder
Do Mundo
Assírio & Alvim, 1994
entre mim e tudo, na mão, amadureço
enquanto ela se torna propícia,
amarela ao influxo do vento de estrela para estrela.
O sangue da mão ensombra a fruta na sua volta
de átomos, abala
imagem, arquitectura.
E o espaço que isto cria: a noite
aparece no ar. E dura, leve, tersa, curva,
a linha
do fogo entrecruza
os pontos paralelos: a pêra desde o esplendor,
a mão desde
o equilíbrio, os centros
do sistema geral do corpo, o buraco negro.
Morro?
Escrevo apenas, e o hausto aspira
dedos e pêra, enigma e sentido, ordem, peso, o papel onde assenta
a constelação do mundo com esse buraco
negro e as palavras em torno.
No instante extremo de
desaparecerem.
Se morro, é por exemplo.
Herberto helder
Do Mundo
Assírio & Alvim, 1994
quinta-feira, 14 de março de 2013
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013
a visita do tio oscar
A 85.ª edição dos Óscares decorreu esta madrugada dentro, no Dolby Theatre, em Los Angeles, numa cerimónia apresentada
pelo comediante Seth MacFarlane.
Ao longo de três horas foram atribuídas 24 estatuetas.
Melhor Realizador
Ang Lee - «A Vida de Pi»
Melhor Filme
«Argo»
Melhor Atriz Secundária
Anne Hathaway - «Os Miseráveis»
Melhor Atriz Principal
Jennifer Lawrence - «Silver Linings Playbook»
Melhor Ator Principal
Daniel Day-Lewis - «Lincoln»
Melhor ator secundário
Cristoph Waltz, «Django Libertado»
Melhor argumento adaptado:
"Argo"
Melhor argumento original:
"Django Libertado"
Melhor filme estrangeiro (de língua não inglesa):
"Amor" (Áustria)
Melhor filme de animação:
"Brave"
Melhor documentário:
"Searching for sugar man"
Melhor documentário em curta-metragem:
"Inocente"
Melhor curta-metragem:
"Curfew"
Melhor curta-metragem de animação:
"Paperman"
Melhor produção artística:
"Lincoln"
Melhor fotografia:
"A vida de Pi"
Melhor montagem:
"Argo"
Melhor caracterização:
"Os miseráveis"
Melhor guarda-roupa:
"Anna Karenina"
Melhor Banda-sonora original
«Life of Pi» (Mychael Danna)
Melhor Canção original
"Skyfall", de "007 - Operação Skyfall" - Adele (música e letra)
Melhor montagem de som:
"Skyfall"
"00:30 Hora Negra"
Melhor mistura de som:
"Os miseráveis"
Melhores efeitos visuais:
"A vida de Pi"
Ao longo de três horas foram atribuídas 24 estatuetas.
Melhor Realizador
Ang Lee - «A Vida de Pi»
Melhor Filme
«Argo»
Melhor Atriz Secundária
Anne Hathaway - «Os Miseráveis»
Melhor Atriz Principal
Jennifer Lawrence - «Silver Linings Playbook»
Melhor Ator Principal
Daniel Day-Lewis - «Lincoln»
Melhor ator secundário
Cristoph Waltz, «Django Libertado»
Melhor argumento adaptado:
"Argo"
Melhor argumento original:
"Django Libertado"
Melhor filme estrangeiro (de língua não inglesa):
"Amor" (Áustria)
Melhor filme de animação:
"Brave"
Melhor documentário:
"Searching for sugar man"
Melhor documentário em curta-metragem:
"Inocente"
Melhor curta-metragem:
"Curfew"
Melhor curta-metragem de animação:
"Paperman"
Melhor produção artística:
"Lincoln"
Melhor fotografia:
"A vida de Pi"
Melhor montagem:
"Argo"
Melhor caracterização:
"Os miseráveis"
Melhor guarda-roupa:
"Anna Karenina"
Melhor Banda-sonora original
«Life of Pi» (Mychael Danna)
Melhor Canção original
"Skyfall", de "007 - Operação Skyfall" - Adele (música e letra)
Melhor montagem de som:
"Skyfall"
"00:30 Hora Negra"
Melhor mistura de som:
"Os miseráveis"
Melhores efeitos visuais:
"A vida de Pi"
sábado, 16 de fevereiro de 2013
O mestre mentor
THE MASTER, herdeiro da minha MAGNÓLIA, definitivamente, não é um filme fácil.
Mas é o melhor filme do ano.
Adulto, comprometido, acre, profundo, insuportavelmente perdido...
«O Mentor» é o sonho vivo e materializado do eterno estudante de Cinema, e uma adição meritória ao cânone formidável de Anderson sobre as falhas da natureza Humana.
Phoenix, insuperável (mesmo por Day Lewis).
Hoffman, o dito vulcão.
Adams, admirável.
A cena em que ele parte numa motorizada rumo ao infinito para nuna mais voltar é antológica.
A tempo de curar as feridas do passado e as promessas do futuro, num presente exangue, volúvel e inconsistente.
Num mundo em que alguém tem sempre um dono, em que alguém comanda sempre alguém...
MAGNÍFICO!
Mas é o melhor filme do ano.
Adulto, comprometido, acre, profundo, insuportavelmente perdido...
«O Mentor» é o sonho vivo e materializado do eterno estudante de Cinema, e uma adição meritória ao cânone formidável de Anderson sobre as falhas da natureza Humana.
Phoenix, insuperável (mesmo por Day Lewis).
Hoffman, o dito vulcão.
Adams, admirável.
A cena em que ele parte numa motorizada rumo ao infinito para nuna mais voltar é antológica.
A tempo de curar as feridas do passado e as promessas do futuro, num presente exangue, volúvel e inconsistente.
Num mundo em que alguém tem sempre um dono, em que alguém comanda sempre alguém...
MAGNÍFICO!
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013
ave eva
Eva...
ave
Entrego
o pôr-do-sol nas tuas mãos
E
procuro a mundividência fora dos teus olhos (embora por eles queira ver o
mundo)
Sou
um salteador de trovas perdidas
Domesticador
do azul que de mim brota
Se
te disserem que não te mereço
Pensa
que o azul sempre se deu bem com o fogo que te amarrota...
Sabes,
esperarei sempre por ti, mesmo que chegues a horas pardas!
segunda-feira, 28 de janeiro de 2013
quinta-feira, 24 de janeiro de 2013
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
Les Miserables
A indigência não tem fim. E, pelos vistos, não falta quem adore.
Não sei se vomite, se ria, se chore, se....não posso dizer.
Que Deus se apiede daquela maralha.
E XAU.
(Não consigo adicionar imagens neste momento.....mais uma razão para não vir aqui tão cedo.) Desculpem.
Gui
Pode não haver comida...pode não haver dinheiro para a renda...mas todos os pobres e miseráveis ficam contentes com os milhares que estes ignorantes e medíocres e inúteis vão ganhar na TVI, com a Casa dos Segredos...Decisão Final...Algo muito importante que a Teresa Guilherme, o Carlos Moedas e o FMI andam a apoiar e a defender como solução para o país. vamos todos para a casa e a Voz passa a FMI.
Que merda de gente e de país e que tristeza franciscana.Não sei se vomite, se ria, se chore, se....não posso dizer.
Que Deus se apiede daquela maralha.
E XAU.
(Não consigo adicionar imagens neste momento.....mais uma razão para não vir aqui tão cedo.) Desculpem.
Gui
quarta-feira, 2 de janeiro de 2013
segunda-feira, 24 de dezembro de 2012
paz
Norah Jones –
Peace
There's a place that I know where
the sycamores grow
And daffodils have their fun
Where the cares of the day seems to
slowly fade away
And the glow of the evening sun
Peace when the day is done
If I go there real late, let my mind
meditate on everything to be done
If I search deep inside, let my
conscience be my guide
Then the answers are sure to come
Don't have to worry none
When you find a piece of mind
Leave you worries behind
Don't say that it can't be done
With a new point of view
Life's true meaning comes to you
And the freedom you seek is one
Peace is for everyone
Peace is for everyone
Peace is for everyone
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
O amor é uma pomba louca
AMOUR de Michael Haneke transporta-nos para o
ocaso das vidas que se passam defronte a nós, dentro de nós, como
passaportes de uma mortalidade que se crê vâ e melancólica, sempre à
espera do fechar da cortina, do final do concerto de Shubert
(que se ouve lucida e exaustivamente pela tela dentro), da prisão
daquela doida pomba que nos entra pelo peito dentro, pela janela fora e
que não somos capazes de manter aprisionada. É um homem que ama uma
mulher, musa dos seus dias, é uma mulher que ensina Bach e Beethoven a
quem a quiser ouvir. É o crepúsculo dela à beira de um sorriso dele,
que dela cuida como porcelana, sem querer que mais ninguém lhe toque. E
dela trata, lavando-a, erguendo-a das cinzas até ao último dos recursos e
da decisão mais fatal porque mais libertadora. Não há filhos ou filhas
que o prendam, há apenas um suave milagre erigido do amor dos homens e
das mulheres que se amam para além da vida, por altura da morte, por
causa da morte feita vida ou da vida à espera da morte...
Magníficos Trintignant e Riva numa sonata de outono a ver e a rever...
Porque «sur le pont d'Avignon, on y dance!»...
Até que a morte nos reúna e nela se faça vida!
Porque «sur le pont d'Avignon, on y dance!»...
Até que a morte nos reúna e nela se faça vida!
sábado, 8 de dezembro de 2012
nome
Escrevo o teu nome que sei
O teu sinal que desvenda a tua vulnerabilidade de mulher só
Rodopio a mão pela areia que brota do teu mar
E sinto as algas tocarem-me no fundo do meu peito
Aquela pomba enlouquecida
Que trazes escondida nos cabelos
Sossega, então, no meu regaço
Até à hora em que me venhas ver de novo
Ensinando-me um novo nome
O teu sinal que desvenda a tua vulnerabilidade de mulher só
Rodopio a mão pela areia que brota do teu mar
E sinto as algas tocarem-me no fundo do meu peito
Aquela pomba enlouquecida
Que trazes escondida nos cabelos
Sossega, então, no meu regaço
Até à hora em que me venhas ver de novo
Ensinando-me um novo nome
sábado, 24 de novembro de 2012
domingo, 11 de novembro de 2012
O sorriso de Peter Pan
No dia 8, numa tertúlia deliciosa em Sintra, onde se dissertou, em tom vadio e
muito sério, sobre o superior interesse da criança (com a «minha» PGR, os meus
mestres Laborinho e Leandro, a minha amiga Teresa Villas, comissária e
paladina das crianças de Sintra e demais equipa), forjei, em tom de
síntese, o seguinte:
«Chovia prata naquela noite.
A luz apagou-se.
Súbita, solene, urgente.
«Chovia prata naquela noite.
A luz apagou-se.
Súbita, solene, urgente.
O Ricardo ficou quieto, com a voz também apagada.
Parda.
Indolor.
No escuro, recordou a 25ª hora em que perseguiu o riso do Peter pan, entre serpentinas de sorrisos que o cravo e a rosa que o geraram deixaram de ter guardado para si.
Nunca o encontrou.
Nunca lhe tocou.
O cravo e a rosa murcharam.
os homens deixaram de ter leme.
Sem dó.
Com piedade.
O avô, autor dos seus melhores poemas, já tinha partido rumo à Estrela Polar.
Sem nunca se ter despedido.
Com dó.
Sem piedade.
(...)
De repente, o relógio das horas loucas deu sinal de si.
Supremo.
Ufano.
Altivo.
Nasceu naquela aurora uma dádiva em forma de colo, a mais indecente de todas as obsessões.
Ouviu falar dos magos das regras.
Que trabalham de sol a sol, sempre suados. Esforçados.
De villas encantadas, de dinas coloridas e de salvadoras helenas.
De direitos e do seu superior interesse.
De rainhas filomenas.
De lúcios, leandros e vidais que falavam bem dele sem até o conhecerem.
Ouviu alguém dizer que o Amor é uma coisa muito complicada.
Mas ele queria essa complicação nos seus dias e nas noites.
Uma brisa correu célere.
O Ricardo tremeu de calor.
E percebeu, afinal, que alguém, em Sintra, tinha deixado uma luz acesa.
Por causa de si.
E foi nessa altura que, enfim, tocou no Peter Pan...
e voou!
(...)
Noutro casario, perto das ninfas de Byron, Teresa acordou, com um solene compromisso.
E, aliviada, apagou a vela...»
Paulo Guerra, 22h30m do dia 8.11.2012, no ORISHAS em Sintra.
Parda.
Indolor.
No escuro, recordou a 25ª hora em que perseguiu o riso do Peter pan, entre serpentinas de sorrisos que o cravo e a rosa que o geraram deixaram de ter guardado para si.
Nunca o encontrou.
Nunca lhe tocou.
O cravo e a rosa murcharam.
os homens deixaram de ter leme.
Sem dó.
Com piedade.
O avô, autor dos seus melhores poemas, já tinha partido rumo à Estrela Polar.
Sem nunca se ter despedido.
Com dó.
Sem piedade.
(...)
De repente, o relógio das horas loucas deu sinal de si.
Supremo.
Ufano.
Altivo.
Nasceu naquela aurora uma dádiva em forma de colo, a mais indecente de todas as obsessões.
Ouviu falar dos magos das regras.
Que trabalham de sol a sol, sempre suados. Esforçados.
De villas encantadas, de dinas coloridas e de salvadoras helenas.
De direitos e do seu superior interesse.
De rainhas filomenas.
De lúcios, leandros e vidais que falavam bem dele sem até o conhecerem.
Ouviu alguém dizer que o Amor é uma coisa muito complicada.
Mas ele queria essa complicação nos seus dias e nas noites.
Uma brisa correu célere.
O Ricardo tremeu de calor.
E percebeu, afinal, que alguém, em Sintra, tinha deixado uma luz acesa.
Por causa de si.
E foi nessa altura que, enfim, tocou no Peter Pan...
e voou!
(...)
Noutro casario, perto das ninfas de Byron, Teresa acordou, com um solene compromisso.
E, aliviada, apagou a vela...»
Paulo Guerra, 22h30m do dia 8.11.2012, no ORISHAS em Sintra.
domingo, 4 de novembro de 2012
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
quarta-feira, 31 de outubro de 2012
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
for our eyes only
Em que momento a cirurgia e a arte se podem encontrar? O que
têm em comum, onde se encontram? O livro “Fios Condutores”, de João Cutileiro,
pode dar algumas dessas respostas. Dedicado “a todos os que saboreiam arte”, esta
edição exclusiva para o Centro Cirúrgico de Coimbra, reúne 42 desenhos de João
Cutileiro e tem uma edição limitada a 100 exemplares, todos numerados e
assinados pelo autor, em papel reciclado e feito à mão. Em simultâneo, esta
mesma obra tem uma versão digital, acessível no site do Centro Cirúrgico de Coimbra (www.ccci.pt), (segue versão pdf em anexo).
Na nota de abertura, o médico oftalmologista, António
Travassos demonstra as ligações que se podem estabelecer entre a cirurgia e o
desenho. (…) “O defeito e a imperfeição são a matéria da cirurgia. Nos desenhos
de João Cutileiro são a inspiração. Em ambos há vida, força e matéria. A
cirurgia exige talento e arte para corrigir o corpo perfeito e para provocar o
alívio. João Cutileiro despe as mulheres para provocar o traço. A matéria é a
mesma: o corpo» (…) Um corpo humano que, segundo José Saramago, «João Cutileiro
conhece nele o que há, porventura, de mais comovedor: a imperfeição
harmoniosa». Aos desenhos de João Cutileiro, o livro “Fios Condutores” junta um
punhado de poemas e textos de Frederico Garcia Lorca, José Saramago, Luís Vaz
de Camões e Alexandre O’Neill, entre outros.
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
asas
Já escondi um AMOR com medo de perdê-lo, já perdi um AMOR por escondê-lo.
Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.
Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso.
Já passei noites chorando até pegar no sono, já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.
Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.
Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.
Já passei horas na frente do espelho tentando descobrir quem sou, já tive tanta certeza de mim, ao ponto de querer sumir.
Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi.
Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta em meu canto.
Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir.
Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.
Já tive crises de riso quando não podia.
Já quebrei pratos, copos e vasos, de raiva.
Já senti muita falta de alguém, mas nunca lhe disse.
Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar.
Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros.
Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.
Já contei piadas e mais piadas sem graça, apenas para ver um amigo feliz.
Já inventei histórias com final feliz para dar esperança a quem precisava.
Já sonhei demais, ao ponto de confundir com a realidade... Já tive medo do escuro, hoje no escuro "me acho, me agacho, fico ali".
Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais.
Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria.
Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.
Já chamei pela mamãe no meio da noite fugindo de um pesadelo. Mas ela não apareceu e foi um pesadelo maior ainda.
Já
chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas
pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais
para mim.
Não me dêem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre.
Não me mostre o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração!
Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente!
Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra SEMPRE!
Gosto
dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais
poderosas, das ideias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos
sentimentos mais fortes.
Tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar de um penhasco que eu vou dizer:
- E daí? EU ADORO VOAR!
Clarice Lispector
quinta-feira, 4 de outubro de 2012
terça-feira, 25 de setembro de 2012
ser amado
Uma vez amei, julguei que me amariam,
Mas não fui amado.
Não fui amado pela unica grande razão -
Porque não tinha que ser.
Consolei-me voltando ao sol e a chuva,
E sentando-me outra vez a porta de casa.
Os campos, afinal, não são tão verdes para os que são amados
Como para os que o não são.
Sentir é estar distraído.
domingo, 16 de setembro de 2012
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
segunda-feira, 10 de setembro de 2012
segunda-feira, 3 de setembro de 2012
E agora José?
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde? Carlos Drummond de Andrade
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde? Carlos Drummond de Andrade
segunda-feira, 27 de agosto de 2012
domingo, 26 de agosto de 2012
O vento de novo
O essencial é ter o vento.
Compra-o; compra-o depressa,
A qualquer preço.
Dá por ele um princípio, uma ideia,
Uma dúzia ou mesmo dúzia e meia
Dos teus melhores amigos, mas compra-o.
Outros, menos sagazes
E mais convencionais,
Te dirão que o preciso, o urgente,
É ser o jogador mais influente
Dum trust de petróleo ou de carvão.
Eu não:
O essencial é ter o vento.
E agora que o Outono se insinua
No cadáver das folhas
Que atapeta a rua
E o grande vento afina a voz
Para requiem do Verão,
A baixa é certa.
Compra-o; mas compra-o todo,
De modo
Que não fique sopro ou brisa
Nas mãos de um concorrente
Incompetente.
Reinaldo Ferreira , "Poemas" Livro I - Um Voo Cego a Nada
sexta-feira, 17 de agosto de 2012
quinta-feira, 9 de agosto de 2012
terça-feira, 24 de julho de 2012
quinta-feira, 19 de julho de 2012
Sem título (como 90% das obras expostas em galerias de arte)
Esta droga está a funcionar direito ou não? é que se continua a comer mensagens vou ali e não volto.
Sem foto....sem nada...apenas margas palavras para isto e para o raio de vírus, ou que se seja, que aqui passou.
Sem foto....sem nada...apenas margas palavras para isto e para o raio de vírus, ou que se seja, que aqui passou.
terça-feira, 17 de julho de 2012
Vou-me embora de mim.
(...) Apanho um combóio e um barco, viajo para lá do acontecimento
que é sentir-me ser de ali. Vou-me embora de mim.
Este diálogo não acabou e não acabará nunca. Vou
com os camponeses da cidade, feliz como um animal doméstico,
por vezes como um cão vadio no inverno, cuja felicidade
é apenas atingir a primavera seguinte.
Vou com as gaivotas que procuram a vida
nas milhares de toneladas de lixo da civilização. Vou também
com a dor de todos os massacres e com os missionários confortáveis
que querem governar o mundo sem saber governar o próprio estômago.
E vou ainda com. E com. E com. E com.
E vou ainda.
Joaquim Pessoa, in Vou-me Embora de Mim.
domingo, 24 de junho de 2012
domingo, 17 de junho de 2012
quinta-feira, 14 de junho de 2012
RedaCÇão
Declaração de Amor à Língua Portuguesa
Teolinda Gersão, Junho, 2012
Vou chumbar a Língua Portuguesa, quase toda a turma vai chumbar, mas a
gente está tão farta que já nem se importa. As aulas de português são
um massacre. A professora? Coitada, até é simpática, o que a mandam
ensinar é que não se aguenta. Por exemplo, isto: No ano passado, quando
se dizia “ele está em casa”, ”em casa” era o complemento circunstancial
de lugar. Agora é o predicativo do sujeito.”O Quim está na retrete” :
“na retrete” é o predicativo do sujeito, tal e qual como se disséssemos
“ela é bonita”. Bonita é uma característica dela, mas “na retrete” é
característica dele? Meu Deus, a setôra também acha que não, mas passou a
predicativo do sujeito, e agora o Quim que se dane, com a retrete
colada ao rabo.
No ano passado havia complementos circunstanciais de tempo, modo,
lugar etc., conforme se precisava. Mas agora desapareceram e só há o
desgraçado de um “complemento oblíquo”. Julgávamos que era o simplex a
funcionar: Pronto, é tudo “complemento oblíquo”, já está. Simples, não
é? Mas qual, não há simplex nenhum, o que há é um complicómetro a
complicar tudo de uma ponta a outra: há por exemplo verbos transitivos
directos e indirectos, ou directos e indirectos ao mesmo tempo, há
verbos de estado e verbos de evento, e os verbos de evento podem ser
instantâneos ou prolongados, almoçar por exemplo é um verbo de evento
prolongado (um bom almoço deve ter aperitivos, vários pratos e muitas
sobremesas). E há verbos epistémicos, perceptivos, psicológicos e
outros, há o tema e o rema, e deve haver coerência e relevância do tema
com o rema; há o determinante e o modificador, o determinante possessivo
pode ocorrer no modificador apositivo e as locuções coordenativas podem
ocorrer em locuções contínuas correlativas. Estão a ver? E isto é só o
princípio. Se eu disser: Algumas árvores secaram, ”algumas” é um
quantificativo existencial, e a progressão temática de um texto pode
ocorrer pela conversão do rema em tema do enunciado seguinte e assim
sucessivamente.
No ano passado se disséssemos “O Zé não foi ao Porto”, era uma frase
declarativa negativa. Agora a predicação apresenta um elemento de
polaridade, e o enunciado é de polaridade negativa.
No ano passado, se disséssemos “A rapariga entrou em casa. Abriu a
janela”, o sujeito de “abriu a janela” era ela, subentendido. Agora o
sujeito é nulo. Porquê, se sabemos que continua a ser ela? Que aconteceu
à pobre da rapariga? Evaporou-se no espaço?
A professora também anda aflita. Pelo vistos no ano passado ensinou
coisas erradas, mas não foi culpa dela se agora mudaram tudo, embora a
autora da gramática deste ano seja a mesma que fez a gramática do ano
passado. Mas quem faz as gramáticas pode dizer ou desdizer o que quiser,
quem chumba nos exames somos nós. É uma chatice. Ainda só estou no
sétimo ano, sou bom aluno em tudo excepto em português, que odeio, vou
ser cientista e astronauta, e tenho de gramar até ao 12º estas coisas
que me recuso a aprender, porque as acho demasiado parvas. Por exemplo, o
que acham de adjectivalização deverbal e deadjectival, pronomes com
valor anafórico, catafórico ou deítico, classes e subclasses do
modificador, signo linguístico, hiperonímia, hiponímia, holonímia,
meronímia, modalidade epistémica, apreciativa e deôntica, discurso e
interdiscurso, texto, cotexto, intertexto, hipotexto, metatatexto,
prototexto, macroestruturas e microestruturas textuais, implicação e
implicaturas conversacionais? Pois vou ter de decorar um dicionário
inteirinho de palavrões assim. Palavrões por palavrões, eu sei dos bons,
dos que ajudam a cuspir a raiva. Mas estes palavrões só são para
esquecer. Dão um trabalhão e depois não servem para nada, é sempre a
mesma tralha, para não dizer outra palavra (a começar por t, com 6
letras e a acabar em “ampa”, isso mesmo, claro.)
Mas eu estou farto. Farto até de dar erros, porque me põem na frente
frases cheias deles, excepto uma, para eu escolher a que está certa.
Mesmo sem querer, às vezes memorizo com os olhos o que está errado, por
exemplo: haviam duas flores no jardim. Ou: a gente vamos à rua.
Puseram-me erros desses na frente tantas vezes que já quase me parecem
certos. Deve ser por isso que os ministros também os dizem na televisão.
E também já não suporto respostas de cruzinhas, parece o totoloto.
Embora às vezes até se acerte ao calhas. Livros não se lê nenhum, só nos
dão notícias de jornais e reportagens, ou pedaços de novelas. Estou
careca de saber o que é o lead, parem de nos chatear. Nascemos curiosos e
inteligentes, mas conseguem pôr-nos a detestar ler, detestar livros,
detestar tudo. As redacções também são sempre sobre temas chatos, com um
certo formato e um número certo de palavras. Só agora é que estou a
escrever o que me apetece, porque já sei que de qualquer maneira vou ter
zero.
E pronto, que se lixe, acabei a redacção – agora parece que se
escreve redação. O meu pai diz que é um disparate, e que o Brasil não
tem culpa nenhuma, não nos quer impor a sua norma nem tem sentimentos de
superioridade em relação a nós, só porque é grande e nós somos
pequenos. A culpa é toda nossa, diz o meu pai, somos muito burros e
julgamos que se escrevermos ação e redação nos tornamos logo do tamanho
do Brasil, como se nos puséssemos em cima de sapatos altos. Mas, como os
sapatos não são nossos nem nos servem, andamos por aí aos trambolhões, a
entortar os pés e a manquejar. E é bem feita, para não sermos burros.
E agora é mesmo o fim. Vou deitar a gramática na retrete, e quando a
setôra me perguntar: Ó João, onde está a tua gramática? Respondo: Está
nula e subentendida na retrete, setôra, enfiei-a no predicativo do
sujeito.
João Abelhudo, 8º ano, turma C (c de c…r…o, setôra, sem ofensa para si, que até é simpática).
segunda-feira, 11 de junho de 2012
são claras as crianças
São claras as crianças como candeias sem vento,
seu coração quebra o mundo cegamente.
E eu fico a surpreendê-las, embebido no meu poema,
pelo terror dos dias, quando
em sua alma os parques são maiores e as águas turvas param
junto à eternidade.
As crianças criam. São esses os espaços
onde nascem as suas árvores.
Enquanto as câmpanulas se purificam no cimo do fogo,
as crianças esmigalham-se.
Seu sangue evoca
a tristeza, tristeza, a tristeza
primordial.
- Enlouquecem depressa caídas no milagre. Entram
pelos séculos
entre cardumes frios, com o corpo espetado nas luzes
e o olhar infinito de quem não possui alma.
Seu grito remonta ao verão. Inspira-as
a velocidade da terra.
As crianças enlouquecem em coisas de poesia.
Escutai um instante como ficam presas
no alto desse grito, como a eternidade as acolhe
enquanto gritam e gritam.
- É-lhes dado o pequeno tempo de um sono
de onde saem
assombradas e altas. Tudo nelas se alimenta.
Dali a vida de um poema tira
por um lado apaixonamento; por outro,
purificação.
Nelas se festeja a imensidade
dos meses, a melancolia, a silenciosa
pureza do mundo.
Quem há-de pensar para as crianças, sem ter
espinhos nas vozes desertas
até ao fundo? É vendo-se aos espelhos,
no seguimento da noite,
que as crianças aparecem com o horror
da sua candura, as crianças fundamentais, as grandes
crianças vigiadoras -
cantando, pensando, dormindo loucamente.
Não há laranjas ou brasas ou facas iluminadas
que a vingança não afaste.
As crianças invasoras percorrem
os nomes - enchem de uma fria
loucura inteligente
as raízes e as folhas da garganta.
Aprendemos com elas os corredores do ar,
a iluminação, o mistério
da carne. Partem depois, sangrentas,
inomináveis. Partem de noite
noite - extremas e únicas.
- E nada mais somos do que o Poema onde as crianças
se distanciam loucamente.
seu coração quebra o mundo cegamente.
E eu fico a surpreendê-las, embebido no meu poema,
pelo terror dos dias, quando
em sua alma os parques são maiores e as águas turvas param
junto à eternidade.
As crianças criam. São esses os espaços
onde nascem as suas árvores.
Enquanto as câmpanulas se purificam no cimo do fogo,
as crianças esmigalham-se.
Seu sangue evoca
a tristeza, tristeza, a tristeza
primordial.
- Enlouquecem depressa caídas no milagre. Entram
pelos séculos
entre cardumes frios, com o corpo espetado nas luzes
e o olhar infinito de quem não possui alma.
Seu grito remonta ao verão. Inspira-as
a velocidade da terra.
As crianças enlouquecem em coisas de poesia.
Escutai um instante como ficam presas
no alto desse grito, como a eternidade as acolhe
enquanto gritam e gritam.
- É-lhes dado o pequeno tempo de um sono
de onde saem
assombradas e altas. Tudo nelas se alimenta.
Dali a vida de um poema tira
por um lado apaixonamento; por outro,
purificação.
Nelas se festeja a imensidade
dos meses, a melancolia, a silenciosa
pureza do mundo.
Quem há-de pensar para as crianças, sem ter
espinhos nas vozes desertas
até ao fundo? É vendo-se aos espelhos,
no seguimento da noite,
que as crianças aparecem com o horror
da sua candura, as crianças fundamentais, as grandes
crianças vigiadoras -
cantando, pensando, dormindo loucamente.
Não há laranjas ou brasas ou facas iluminadas
que a vingança não afaste.
As crianças invasoras percorrem
os nomes - enchem de uma fria
loucura inteligente
as raízes e as folhas da garganta.
Aprendemos com elas os corredores do ar,
a iluminação, o mistério
da carne. Partem depois, sangrentas,
inomináveis. Partem de noite
noite - extremas e únicas.
- E nada mais somos do que o Poema onde as crianças
se distanciam loucamente.
Loucamente.
Herberto Helder
Ofício Cantante
Assírio & Alvim, 2009
sexta-feira, 8 de junho de 2012
terça-feira, 5 de junho de 2012
A oriente nada de novo
Este lugar amou perdidamente
Quem o cabo rondou do extremo Sul
E a costa indo seguindo para Oriente
Viu as ilhas azuis do mar azul
Viu pérolas, safiras e corais
E a grande noite parada e transparente
Viu cidades, nações, viu passar gente
De leve passo e gestos musicais
Perfumes e tempero descobriu
E danças onduladas por vestidos
Sedosos, flutuantes e compridos
E outro nasceu de tudo quanto viu.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Quem o cabo rondou do extremo Sul
E a costa indo seguindo para Oriente
Viu as ilhas azuis do mar azul
Viu pérolas, safiras e corais
E a grande noite parada e transparente
Viu cidades, nações, viu passar gente
De leve passo e gestos musicais
Perfumes e tempero descobriu
E danças onduladas por vestidos
Sedosos, flutuantes e compridos
E outro nasceu de tudo quanto viu.
Sophia de Mello Breyner Andresen
domingo, 3 de junho de 2012
Aguns Sei
Faces sob o sol, os olhos na cruz
Os heróis do bem prosseguem na brisa da manhã
Vão levar ao reino dos minaretes a paz na ponta dos arietes
A conversão para os infiéis
Para trás ficou a marca da cruz
Na fumaça negra vinda na brisa da manhã
Ah, como é difícil tornar-se herói
Só quem tentou sabe como dói vencer Satã só com orações
Ê andá pa Catarandá que Deus tudo vê
Ê andá pa Catarandá que Deus tudo vê
Ê anda, ê ora, ê manda, ê mata, responderei não!
Dominus dominium juros além
Todos esses anos agnus sei que sou também
Mas ovelha negra me desgarrei, o meu pastor não sabe que eu sei
Da arma oculta na sua mão
Meu profano amor eu prefiro assim
À nudez sem véus diante da Santa-Inquisição
Ah, o tribunal não recordará dos fugitivos de Shangri-Lá
O tempo vence toda a ilusão
Cantado por Elis Regina
Os heróis do bem prosseguem na brisa da manhã
Vão levar ao reino dos minaretes a paz na ponta dos arietes
A conversão para os infiéis
Para trás ficou a marca da cruz
Na fumaça negra vinda na brisa da manhã
Ah, como é difícil tornar-se herói
Só quem tentou sabe como dói vencer Satã só com orações
Ê andá pa Catarandá que Deus tudo vê
Ê andá pa Catarandá que Deus tudo vê
Ê anda, ê ora, ê manda, ê mata, responderei não!
Dominus dominium juros além
Todos esses anos agnus sei que sou também
Mas ovelha negra me desgarrei, o meu pastor não sabe que eu sei
Da arma oculta na sua mão
Meu profano amor eu prefiro assim
À nudez sem véus diante da Santa-Inquisição
Ah, o tribunal não recordará dos fugitivos de Shangri-Lá
O tempo vence toda a ilusão
Cantado por Elis Regina
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